Quebra molas



Com amor, à Carabina

Pedro Emmanuel

 

Quase cento-e-vinte por hora. No rádio: algum desses roqueirinhos dos anos oitenta; daqueles que esbanjam glamour e estilo. You Know, i'm a dreamer. Acho que era isso, não me lembro ao certo a letra; estava bêbado. O pé do freio descansava. Enquanto seu par, pisava fundo no pedal que acelera. Minha cabeça fervilhava e fritava aos solos de guitarra. Loucos e sozinhos. Bêbado demais para notar as placas  de limite. Em algum quilômetro desconhecido de alguma interestadual desconhecida; até aqui, o anonimato é plausível, ele esconde nossos segredos obscuros e se converte a um amante glorioso; deveras juras de amor e confidencialidade de sobra. Busco em com os dedos anelar e mindinho, algum cigarro remanescente no maço, que antes se escondia no porta-luvas. Alcanço-o e ponho entre os lábios. Fecho o meu vidro e com muito esforço eu consigo. manivela filha da puta; preciso lembrar de aplicar algum óleo. Busco o isqueiro no bolso, então depois de me esticar e quase me esmagar na porra da porta, consigo encontrar. Então acendo-o. A primeira tragada; confiando às fumaças a ida das más memórias. Me apego aos pequenos detalhes; a brasa que logo aquecerá meus dedos e o quebra-molas daqui a uma centena de metros. Rezando para que o freio me segure, e talvez eu receba o tranco, mas reduzido; é interessante como um cigarro faz a nossa mente.       


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