Saturno devorando sua prole, ou o deus do tempo que engole sua prole


Matthew


Hoje, fui em uma exposição artística. Mais ou menos lá no centro. Vi uma releitura de um artista gringo, sobre aquela obra... de um deus que, literalmente, come seu filho. O titulo era bem sugestivo, objetivo, algo como “Saturno devorando sua prole”. Recordei-me, na hora, de que a temática da obra era conhecida. Devo ter visto algo parecido na época de escola. Saturno, se não me engano, era o equivalente à Cronos, o deus do tempo. O deus do tempo que engole sua prole... isso me marcou, era algo horrendo, e não, não to falando no sentido moral da coisa, não agora. “O tempo que nos engole, isso soa profundo" disse um cara, que de cara identifiquei como um desses goodvibes-meio-ripongo, e isso me causou repulsa. “O tempo, na ótica capitalista-contemporânea-ocidental é o equivalente ao dinheiro, sabia?” continuava a conversar com a guria ao lado. “Esse cara tá falando sério?” me perguntei... era óbvio que ele pensava isso, como esses comunistas e revolucionários de sofá. Tão fácil reclamar que o capitalismo nos engole constantemente, tendo uma Louis Vuitton e uma câmera digital Canon no pescoço. Tentei voltar à minha linha de raciocínio... O deus do tempo, que engole sua prole... “Talvez ele tenha usado ‘prole’ de maneira similar à proletariado, que se originou do termo... uma critica SEVERA ao capitalismo e o tempo, e como curtimos o ócio, entende gata?”, esse cara tá de sacanagem... ele tá dando uma de critico numa hora dessas? Não descarto o que ele disse, mas quem ele tá tentando impressionar? Penso que a figura do tempo engolindo tudo que há pela frente, reflete diretamente no cotidiano... clamamos por mais tempo, pedimos e imploramos à Deus, que nos dê mais tempo... Mas porra, ninguém aqui tá interessado em como você é culto, cara. Além de que esse papo soa “burguês” de mais, pro meu gosto. Acredito que nem todos tem o privilégio de “gozar” o tempo, estamos mais preocupados em sobreviver do que “curtir o ócio”.

Era uma “pérola” atrás da outra. fiquei de ouvido, meio que um “flaneur”, só pra ver aonde aquela história ia dar. A garota se afastou e ele foi atrás... importunando a vida da coitada. Fiquei ali, então, sozinho. Acendi um cigarro, observando furtivamente se havia alguma placa antitabagismo... não tinha, me aproveitei disso, o local era aberto. Fiquei os próximos dez minutos, o tempo do cigarro acabar, observando a obra... devaneios e devaneios, me dei conta do tempo quando o cigarro, quase que me queimando, acabou. Joguei-o no chão e sai. O tempo virou, começou a nublar, e já estava tarde. Parti então... tinha deixado a roupa no varal. Sem dúvida aquele cara deve ter um QI elevado, ou deve ser um boyzinho-metido-a-escritor... rio baixo a mim mesmo... mas ele não deixa de ser um babaca. 

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